"
Parece que foi ontem o dia que nos conhecemos. Lugar errado, gente errada. Apesar do exterior, senti em você um conforto. Costumo estranhar, a princípio, as pessoas com as quais eu me dou bem se me deixo levar. E com você não foi diferente: entre indas e vindas, consegui me encontrar. Preto no branco, pude descobrir que sempre fomos muito idênticos e, ao mesmo tempo, muito opositivos, ao par que nossas atitudes eram, normalmente, diversas, mas levariam a um mesmo fim e nossas posturas eram conflitantes, mas sempre batalhavam por um mesmo desfecho. Nossa convivência nos fazia infinitamente bem. Compartilhávamos conhecimentos, confidências, delícias. Eu sempre fui seu e você, meu.

Acho que vivi por todos esses anos com uma certeza que de não te perderia, de que seria insubstituível à sua vida. Porém confesso que, recentemente, não consigo mais vizualizar aquilo que fora "nós" num passado-mais-que-perfeito. Não consigo mais fechar os olhos e escutar sua voz ecoando dentro da minha mente. Vejo nossas fotos juntos e entendo que, apesar de os momentos serem efêmeros, as memórias se reguardam pra sempre. Sem data pra não ficar no passado. Se um dia eu soube que você me pertencia, hoje já não guardo mais essa razão comigo.

É óbvio que nossa existência tomou rumos distintos, colocando cada qual de nós a trilhar uma rota incerta e obscura. E durante esse processo, conhecemos e continuamos a conhecer pessoas novas, igualmente (ou não) necessárias a nós mesmos. Apesar disso, não acredito que nossos laços devam afrouxar-se. Nossas ligações estão tão enfraquecidas que eu já desconfio se você ainda é aquele que conheci há alguns anos. Se ainda é quem sempre se escondeu, franzino e frágil, por entre as mazelas de um esteriótipo e se mascarou. Se ainda é quem me segurou em pé quando tudo conspirou pela minha queda, pelo meu fracasso, pela minha depressão. Se ainda é quem me disse, olhando nos olhos, o eu te amo mais sincero que já escutei de um amigo até hoje.

Eu sempre soube me fingir de forte e vestir a indiferença, quando, na verdade, o que mais tive foi vontade de chorar. Eu sempre fui muito orgulhoso do meu caráter e das minhas atitudes pra aceitar um erro, um desvio. Eu sempre fui muito sucinto quando lhe contei sobre os meus sentimentos, mas sempre soube que você me compreenderia, saberia ler minhas chagas e que teria um curativo, que zelaria pelo meu bem-estar acima de tudo. Por debaixo de toda minha sisudez, guardo um coração mole, fraco, carente. Sou possessivo, tenho muitos ciúmes das minhas amizades, das minhas conquistas. Dentro dessa minha conchinha, existe um ser que tem medo de ser ridicularizado pelos sentimentos, de ser rejeitado por quem mais preza— um ser que tem medo, acima de tudo, de perder quem ele ama de verdade. A cada palavra, meus olhos se desmancham mais e mais em águas.

Quero consertar tudo aquilo que construímos sem precauções, sem dar a devida importância e quero ter uma segunda chance pra reescrever esse conto que chamamos de vida. Busco reavivar a chama que queimava aqui dentro quando pensava em você. Nossa amizade tem um valor imensurável a mim a ponto de revés algum me fazer desistir. Quero, mais do que tudo, que voltemos ao passado e que nossa necessidade de um pelo outro volte a existir, volte a nos obrigar aos encontros, aos momentos juntos, às conversas.

"[…] Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens cabelos dourados. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo, que é dourado, fará com que eu me lembre de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo…"

Nunca se esqueça, você se torna eternamente responsável por aquele que cativa...